Tartarugas na Amazônia escolhem o melhor lugar para depositar os ovos na praia

Publicado em: 29 de junho de 2018

Pesquisa monitorou ninhos de três espécies de quelônios na Amazônia e analisou quais as preferências das "mães tartarugas" no momento da reprodução

Julho chega e as praias de água doce viram berçários para milhares de tartarugas na Amazônia. Até janeiro do ano seguinte, iaçás, tracajás e tartarugas-da-amazônia, aos montes, vão buscar as margens de rios e lagos para depositar ovos na areia. A escolha de um bom lugar para construir o ninho é fundamental para o sucesso da reprodução. Uma pesquisa do Instituto Mamirauá analisou a preferência e o uso de locais de desova feito por três espécies de tartarugas em uma praia na região do Médio Solimões, estado do Amazonas.

Em busca dos ninhos

A Praia do Horizonte é uma faixa de areia na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá. De agosto a dezembro de 2016, pesquisadores percorreram os cerca de três quilômetros (sentido leste/oeste) e 500 metros (sentido norte/sul) de extensão da praia, monitorando ninhos. Os rastros deixados na areia pelas "mães tartarugas" foram pistas para a equipe localizar os pontos de desova. Á medida que eram identificados, os pontos foram marcados com placas de metal, para posterior procura com detector de metais e registrados no sistema de posicionamento global (GPS).

O monitoramento do Instituto Mamirauá contabilizou 194 ninhos de iaçás (Podocnemis sextuberculata), 11 de ninhos de tracajá (Podocnemis unifilis) e cinco de tartarugas-da-amazônia (Podocnemis expansa).

Além disso, os cientistas coletaram amostras de aproximadamente 200 gramas de areia de cada ninho e também de pontos aleatórios na praia. O material foi usado para análises em laboratório e comparações entre a composição de areia em diferentes áreas. Veja, a seguir, resultados encontrados para cada espécie de tartaruga:

Iaçás: ninhos de areia fina e desova em pontos altos

Donas da maior quantidade de ninhos monitorados, as iaçás concentraram a desova na região central da praia, escolhendo áreas altas, com uma inclinação gradual ao passo que os ninhos ficam mais afastados do rio, no sentido sul-norte.

De acordo com a pesquisa, "a granulometria é predominantemente de areia fina (93,64%)", indicando a preferência por esse tipo de sedimento. As iaçás percorreram grandes distâncias entre a água e os ninhos, em uma média superior a 90 metros.

Tracajás: areia, argila e desova em locais com umidade

Em comparação, os tracajás fizeram um caminho menor até os pontos de desova, ficando em uma média de 71,1 metros. A localização dos ninhos da espécie demonstrou uma escolha das fêmeas pela zona norte da praia.

"A maioria dos ninhos de tracajá se encontrava na parte norte da praia, onde havia uma inclinação abrupta, tendo a maior média de altura entre as espécies (média = 6,18 m) ", afirma o estudo, assinado pelos pesquisadores do Instituto Mamirauá, Marina Secco e Robinson Botero-Arias, David Guimarães da Universidade Federal do Acre (UFAC), e Cássia Camillo, pesquisadora da Universidade da Flórida.

As amostras coletadas na região de desova dos tracajás apresentaram uma concentração moderada de argila misturada à areia, o que ajuda a criar "um local adequado para a postura, uma vez que essa espécie prefere depositar seus ovos em locais mais úmidos".

A escolha dos lugares mais altos para a desova dos ovos de tracajá chamou a atenção dos pesquisadores, já que a tartaruga-da-amazônia é mais reconhecida por esse comportamento. "Isso pode ser explicado se levado em consideração a distância entre o ninho e a água, uma vez que P. unifilis prefere desovar em locais próximos ao rio e, na praia estudada, havia um corpo d’água próximo às maiores alturas encontradas", consideram.

Tartarugas-da-amazônia: areia grossa e menor tempo de incubação

Os ninhos da terceira espécie investigada, a tartaruga-da-amazônia, ocuparam a porção sul da praia do Horizonte, próximos da água. As alturas dos pontos de desova ficaram entre 4 e 6 metros. 

De acordo com os autores da pesquisa, "por apresentarem uma maior fração de areia grossa (0,44%) e menor de argila (2,43%) e se encontrarem em locais altos (os ninhos) possuem um menor tempo de incubação".

Além da análise dos usos de locais de desova feito por cada espécie, os cientistas apuraram características de pontos da praia com ninhos e daqueles onde não havia ovos de tartaruga.

Áreas de desova têm mais areia grossa

Os locais de desova e os que não tinham ovos tiveram grandes diferenças de altura e presença de areia grossa. As áreas sem ninhos têm altas concentrações de areia fina, representado mais de 80% de toda composição de areia. Os especialistas acreditam que esse seja um dos motivos "pelo qual algumas áreas da praia não havia desova".

A pesquisa foi conduzida pelo Programa de Pesquisa em Manejo e Conservação de Quelônios do Instituto Mamirauá, unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).

Pesquisa em destaque em simpósio de conservação na Amazônia

O estudo, chamado "Caracterização da área e escolha do local de desova feita por fêmeas de Podocnemis na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá", será apresentado durante os próximos dias 3 a 6 de julho em evento especializado do Instituto Mamirauá. O Simpósio sobre Conservação e Manejo Participativo na Amazônia (Simcon) chega à 15ª edição no município de Tefé, Amazonas, com apresentações e oficinas que dão foco a iniciativas de pesquisa e extensão para a conservação do meio ambiente e desenvolvimento sustentável da região. O evento conta com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam). Saiba mais em https://www.mamiraua.org.br/simcon

Texto: João Cunha

 

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