20 anos Mamirauá: "Trabalhamos com conhecimento para a conservação da Amazônia"

Publicado em: 23 de abril de 2019

Em entrevista, o diretor-geral do Instituto Mamirauá, João Valsecchi do Amaral, fala sobre resultados e expectativas para o futuro da instituição


Hoje, dia 23 de abril, o Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá completa duas décadas de implementação da pesquisa científica em prol da biodiversidade amazônica e da melhoria na qualidade de vida das populações ribeirinhas da região do Médio Solimões, no Amazonas. 

O pesquisador e diretor geral do instituto, João Valsecchi do Amaral, comenta um pouco sobre como foram alcançados os resultados desses 20 anos de trabalho e quais os próximos passos do instituto, uma organização social fomentada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). Confira abaixo a entrevista com o diretor geral. 

O que é o Instituto Mamirauá?


O Instituto Mamirauá é atualmente um dos centros de excelência do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. Nós trabalhamos com a produção de conhecimento científico e de novas tecnologias de manejo para conservação da biodiversidade e melhoria da qualidade de vida das populações amazônicas. A atuação do instituto inclui pesquisa de natureza básica, aplicada e de construção de novas tecnologias voltadas para a questão do manejo de recursos naturais. A nossa pesquisa tem fundamentado a legislação voltada para o manejo desses recursos. 

O exemplo de maior repercussão e projeção para o Instituto Mamirauá foi o manejo de pirarucu aqui na Amazônia. Uma espécie pescada historicamente passou a ser alvo de proteção legal por conta do impacto gerado pela pesca exploratória, e os pescadores aqui da região não podiam mais retirar essa espécie para comercializar de maneira legal. 

Então, a união do conhecimento científico e do tradicional realizada por pesquisadores do instituto e moradores da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá permitiu construir um novo protocolo de manejo para que essa espécie pudesse ser novamente pescada e inserida no mercado.


Rafael Forte
Everson Tavares
Leonardo Lopes

Quais outras espécies são visadas pelos programas do instituto?


Além do pirarucu, tem uma série de outras espécies que tiveram recuperação populacional registrada. Algumas delas nós já estamos trabalhando também para realização do manejo. O jacaré, por exemplo, que existe uma grande demanda por parte das populações locais, para utilizar e manejar a espécie. Nós registramos uma recuperação populacional da espécie muito grande aqui na região e as pesquisas realizadas já permitiram a adequação da legislação vigente. Então, nos próximos anos, a gente deverá começar a trabalhar no manejo de jacarés.

Um outro exemplo de adequação legal e de manejo implementado, baseado nas pesquisas realizadas pelo Mamirauá, é o manejo de produtos florestais madeireiros. Hoje existe uma legislação adequada para manejo de madeira em escala comunitária específico no ambiente de várzea.

Como é o modelo de turismo de base comunitária proposto pelo Instituto Mamirauá? 


Diferente de outras iniciativas de turismo que existem aqui na região, a proposta implementada pelo Mamirauá implica que a gestão da iniciativa de turismo seja realizada pelas comunidades locais. 

Hoje, nós temos um modelo de gestão compartilhada no qual o instituto ainda assume algumas funções dentro da operação do turismo. Nós estamos em um processo de transferência total para as comunidades. A intenção é não só que o turismo se consolide como uma atividade econômica das comunidades, mas que toda gestão possa ser feita nesse âmbito comunitário. 

Se tudo der certo, nos próximos anos nós devamos ter aí, talvez, a primeira iniciativa de turismo gerida por uma associação comunitária composta por várias comunidades, por várias lideranças.

Como esses programas impactam na qualidade de vida das populações amazônicas?


A gente está falando em milhares de pescadores assessorados pelo Programa de Manejo de Pesca, centenas de manejadores de recursos florestais madeireiros ou pessoas que trabalham com turismo. Umas séries de tecnologias para o manejo de ecossistemas estão sendo difundidas pelos nossos técnicos. Tudo isso, em última instância, reverte em qualidade de vida. Talvez o impacto mais óbvio seja o impacto econômico. As atividades de manejo implicam necessariamente de geração de renda, mas o impacto vai além disso: essas pessoas estão começando a ter acesso a uma série de serviços e de recursos que não tinham anteriormente.

O instituto também desenvolve diversas ações na área de saúde. Ações que, a princípio, parecem básicas, mas que tem grande impacto na área das comunidades. Mortalidade infantil, por exemplo, diminuiu 67% desde que começamos a atuar na região. A gente registrou, no início da atuação do Mamirauá, um índice de mortalidade infantil similar a países pobres da África e hoje a gente está na média brasileira. Então, o impacto da atuação no que diz respeito a qualidade de vida é muito grande.

Como você define a importância do Instituto Mamirauá para a região do Médio Solimões?


Essas tecnologias tiveram grande impacto sobre a qualidade de vida e sobre a economia das populações que acabam trabalhando com os recursos aqui na região.

Esses resultados permitiram que essas tecnologias servissem de modelo para outras áreas, e atualmente a atuação do Mamirauá é em basicamente toda a Amazônia. Temos projetos desde a fronteira Brasil-Colômbia, com projetos de pesquisa, até a costa paraense, onde a gente também assessora alguns manejos realizados.

Como esse aumento de alcance das ações do instituto aconteceu?


O sucesso das ações implementadas aqui na região gerou demanda de populações de outras regiões. Ao mesmo tempo, o impacto da nossa atuação foi tão grande que o próprio Ministério da Ciência e Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) nos solicitou que a atividade institucional fosse expandida para outras regiões da Amazônia. Então, as ações de manejo assessoradas originalmente aqui na região do médio Solimões começaram a ser implementadas em toda a Amazônia. 

Algumas ações de manejo como a de pirarucu, que talvez seja a experiência mais bem-sucedida de manejo de vida silvestre que existe na Amazônia, foram replicadas em dezenas de áreas, protegidas e não protegidas, envolvendo comunidades tradicionais e grupos organizados de pescadores urbanos e rurais de praticamente toda a Amazônia. 

Quais os objetivos futuros do Instituto Mamirauá?


A nossa missão é muito clara: nós trabalhamos com geração de conhecimento para gerar impacto sobre a conservação da Amazônia, então o Instituto vai continuar nessa linha. Os resultados que nós obtivemos e que comemoramos agora são muito relevantes para a conservação da biodiversidade, para a economia regional, e até mesmo para a economia do Brasil.

Se a gente for pensar em alguma mudança seria a de escala. Essas tecnologias têm que ser levadas para outras regiões e beneficiar as populações locais. 

Elas [as populações locais] têm de ser as pessoas que de fato se privilegiam do conhecimento científico gerado nesse país. É ali que a gente precisa de mudança de qualidade de vida. Então, se a gente tem que pensar em alguma mudança, seria ampliar a atuação do Mamirauá, fazendo com que os modelos gerados por nós possam ser implementados em outras áreas, e com que as tecnologias que impactam qualidade de vida cheguem de fato aonde precisa.


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