Em 20 anos, pesquisadores do Instituto Mamirauá descobriram 23 novas espécies de animais
Publicado em: 30 de outubro de 2019
Equipe também realizou registros inéditos de espécies no estado do Amazonas; entre elas, cão raro
Apesar de antigo destino de expedições cientÃficas, a Amazônia é detentora de biodiversidade tão grande que novas espécies de fauna e flora são descobertas no bioma em ritmo acelerado. Conhecer a biodiversidade ainda é um dos principais desafios para elaboração de estratégias efetivas de conservação e uso sustentável dos recursos naturais na Amazônia. O elevado custo em logÃstica e o limitado número de pesquisadores em uma área de dimensões continentais são alguns dos problemas enfrentados para a obtenção de dados científicos no bioma.
Na região do Médio Solimões, Amazônia Central, desde 1999 pesquisadores do Instituto Mamirauá já coletaram e identificaram 23 novas espécies de animais e também realizaram registros inéditos de espécies conhecidas em outras regiões.
Os resultados mostram que ainda há muito para conhecer da Amazônia. "Mesmo com muitos pontos de coleta na Amazônia, quando observados os mapas destes registros, percebemos que estes estão concentrados nas margens dos grandes rios. Dessa forma, extensas áreas têm ausência total de dados amostrais", explica o mastozoólogo e pesquisador do Instituto Mamirauá, Ivan Junqueira.
Peixes
A maior parte das descobertas foram entre os peixes da ordem Gymnotiformes, conhecidos como sarapós, com 16 novas espécies descritas. Entre os Cyprinodontiformes, pequenos peixes de água doce, foram três espécies, e na ordem dos Siluriformes, conhecidos como 'peixes-gatos' ou bagres, uma espécie.
O peixe ciclÃdeo anão, de nome cientÃfico Apistogrammoides pucallpaensis, teve confirmada sua ampliação de distribuição geográfica. Com ocorrência restrita à Colômbia e ao Peru, a espécie ornamental foi encontrada na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, descoberta que resultou no primeiro registro da espécie no Brasil. Além disso, os dados obtidos permitiram novos estudos sobre a fecundidade do peixe, publicados de forma inédita por pesquisadores do Instituto Mamirauá, organização social fomentada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).
MamÃferos: nova espécie de macaco, registros de morcegos e cão raro
No grupo dos primatas, foi descoberta uma nova espécie do gênero Leontocebus: um pequeno macaco com peso que varia entre 290 a 480 gramas e pertencente à famÃlia dos Saguis ou dos Soins. A espécie está em fase de descrição e um artigo cientÃfico deve apresentar a nova descoberta.
Os pesquisadores também realizaram registros de três espécies de morcegos no estado do Amazonas: o morcego Vampyrodes caraccioli, o morcego-vampiro-de-perna-peluda (Diphylla ecaudata), conhecido por se alimentar quase exclusivamente de sangue de aves, e o morcego Cynomops planirostris, esta última descoberta destacada pelos pesquisadores pela espécie ter poucos registros no bioma amazônico.
Outro destaque de mamÃfero com novo registro no estado foi o cachorro-do-mato-de-orelhas-curtas (Atelocynus microtis), animal considerado raro. De difÃcil observação, a espécie carece de dados científicos coletados.
Outras espécies em estudo
Estudos sobre outros grupos de animais também estão sendo realizados com dados disponibilizados pelas coleções biológicas do Instituto Mamirauá e de outras instituições de pesquisa.
Uma nova espécie de sapo do gênero Boana e uma de ave do gênero Willisornis estão sendo estudadas para seguir com o processo de descrição em trabalhos conduzidos por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e do Museu Paraense Emilio Goeldi, respectivamente.
Como são feitas as coletas
As descobertas foram realizadas com as informações compiladas após uma série de expedições de campo realizadas ao longo de 20 anos de pesquisas do Instituto Mamirauá principalmente na região do Médio Solimões.
As viagens para coletas são geralmente realizadas em áreas pouco conhecidas do ponto de vista cientÃfico e com potencial de novas descobertas sobre a biodiversidade amazônica.
"Escolhemos as áreas com base em alguns critérios como áreas onde nunca foram realizadas expedições ou que apresentam deficiência de dados, uma paisagem diferente, regiões onde um rio separa fisionomias vegetais diferentes, entre outros. Estas expedições são feitas de barco e duram semanas, por este perÃodo o barco vira nosso laboratório, com a participação de dezenas de pesquisadores especialistas em diversos grupos", afirma Ivan, que é pesquisador do Programa de Capacitação Institucional (PCI) do Conselho Nacional de Desenvolvimento CientÃfico e Tecnológico (CNPq).
Importância das coleções biológicas
Além de servir como ‘memorial’ da biodiversidade, a coleção cientÃfica é um testemunho do histórico de modificações do habitat e das relações entre espécies. "É possÃvel refinarmos a taxonomia para não tratar coisas diferentes como a mesma", diz Ivan. Taxonomia é a disciplina que visa descrever, identificar e classificar organismos biológicos.
"Nos últimos anos, a maioria das espécies novas de mamÃferos descritas foram descobertas revisitando espécimes depositados em coleções cientÃficas. Esses testemunhos da biodiversidade que estão depositados nas coleções, mesmo que coletados há centenas de anos, permitem aplicar metodologias atuais que não existiam à sua época de coleta, possibilitando o refinamento dos dados e revisões do seu status taxonômico, por vezes resultando na descrição de uma nova espécie", explica o pesquisador.
Acervo Biológico do Instituto Mamirauá
Com cerca de 14 mil espécimes catalogados, o Acervo Biológico do Instituto Mamirauá contempla registros de 317 espécies de plantas, 810 de peixes, cerca de 80 de répteis e anfÃbios, 280 de aves, 110 de mamÃferos, 16 de moluscos e aproximadamente 200 de insetos.
"Isso torna a coleção umas das mais importantes representantes da biodiversidade amazônica", avalia o especialista.
A coleção serve como material didático a alunos de diferentes nÃveis de escolas municipais e estaduais de Tefé, do Instituto Federal do Amazonas (IFAM) e da Universidade Estadual do Amazonas (UEA).
Texto: Júlia de Freitas
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