Novas descobertas de aves chamam a atenção para o pouco conhecimento da biodiversidade da região

Publicado em: 15 de setembro de 2017

Uma nova espécie de ave descoberta em 2013 serviu como subsídio para a argumentação que levou à criação de um mosaico de unidades de conservação no sul do estado do Amazonas, no Brasil. Exemplos como esse demonstram a importância do desenvolvimento de pesquisas científicas para conhecimento da biodiversidade amazônica e para o desenvolvimento de estratégias de conservação. Esse exemplo está entre as 45 novas descobertas de aves da Amazônia, divulgadas pela iniciativa Amazônia Viva, do World Wide Fund for Nature (WWF), em parceria com o Instituto Mamirauá, unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, em um relatório que reuniu as novas descobertas da ciência na Amazônia entre 2014 e 2015. Essa é a terceira edição do documento.

Nesta edição, também foram incluídas espécies descritas em 2013, que não foram contempladas na edição anterior do documento.  Além da nova espécie descrita em 2014, outras 44 aves, descritas entre 2010 e 2013, também foram incluídas na publicação. O desenvolvimento do relatório foi possível a partir do levantamento bibliográfico em publicações científicas realizado por um grupo de especialistas. A principal fonte de pesquisa foi o site do South American Classification Committee (SACC), que é o comitê oficial da American Ornithologists’ Union (AOU), além de outras fontes. Ao todo, foram consultadas 28 publicações científicas e também sites especializados, como Wikiaves e Birdlife.

Uma nova espécie foi descrita no ano de 2014, a Cercomacroides fuscicauda, com o nome popular de Riparian Antibird. Seu nome popular remete à preferência do animal por áreas de proximidades do rio, por isso, foi chamado de "ribeirinho". Os pesquisadores perceberam diferenças vocais entre essa e outras espécies do gênero Cercomacra.  A estimativa é que a nova espécie ocorra na região do Peru, Colômbia, Equador, Brasil e Bolívia.

Pedro Meloni Nassar, técnico do Instituto Mamirauá, fez parte do grupo de especialistas que ajudou no desenvolvimento da publicação. De acordo com Pedro, a descoberta de novas espécies na Amazônia é importante em muitos aspectos.  "Destaco três linhas fundamentais: aumento do conhecimento científico, subsídios para criação e gestão de áreas protegidas e divulgação desse conhecimento para a população", reforçou.

O relatório cita que, embora as aves sejam o grupo de vertebrados terrestres mais bem conhecidos, o conhecimento sobre as espécies da Amazônia ainda é escasso. Essa é a terceira edição da publicação, totalizando 79 novas espécies de aves descobertas na Amazônia desde 1999. As edições anteriores reuniram as novas espécies de 1999 a 2009 e 2010 a 2013.

Um dos autores que participou da descrição de algumas das descobertas é Mario Cohn-Haft, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). O pesquisador ressaltou a importância da descrição de novas espécies para a ciência. "Toda espécie nova descrita é importante no esforço constante de catalogar corretamente a existência dos seres vivos que compartilham a terra com a gente e cujo futuro, em grande parte, está nas nossas mãos.  Descrever toda a flora e fauna do planeta é uma das tarefas mais antigas, básicas e nobres da ciência natural", comentou.

De acordo com Mário, em 2013, foi lançada uma publicação com 15 novas espécies de aves da Amazônia, do qual ajudou a elaborar. O material foi divulgado em uma edição especial do Handbook of the Birds of the World (Manual das Aves do Mundo). "Quando descrevemos 15 espécies novas de aves de uma vez, o maior número descrito na mesma publicação em quase 150 anos, mostramos que a Amazônia está longe de estar bem conhecida.  Já sabíamos que a Amazônia tem a maior diversidade de animais e plantas do mundo.  E aves é um dos grupos mais bem estudados de todos e, mesmo assim, tem muitas aves novas.  Imagine com os outros tipos de animais e plantas! A Amazônia não é apenas recordista mundial, mas ainda está longe de marcar sua conta final", disse o pesquisador.

Uma das novas espécies de 2013 que compõem o relatório é o cancão-da-campina (Cyanocorax hafferi), uma bela ave de penas azuladas. O pássaro foi encontrado pela primeira vez na Amazônia brasileira, a 140 km ao sul de Manaus, entre os rios Purus e Madeira. A descoberta da ave contribuiu para justificar a criação de um mosaico de unidades de conservação no sul do estado do Amazonas. "É muito gratificante ver os resultados da pesquisa se converterem tão rapidamente em polí­ticas públicas, ações de conservação e alternativas de renda local", comentou o pesquisador.  

Mário disse que costuma "surfar" pela Amazônia em mapas e imagens de satélite durante suas folgas. Paisagens diferentes e curiosas como campinas e serras isoladas chamam a sua atenção, e algumas vezes o levaram a realizar expedições de pesquisa para essas áreas. "Foi assim que encontrei a gralha, o cancão-da-campina, talvez a descoberta mais surpreendente da minha carreira!  As gralhas e corvos estão entre as aves mais bem conhecidas do mundo, a grande maioria de suas dezenas de espécies tendo sido descrita antes de 1900.  É uma ave grandinha, barulhenta, social.  Parecia inconcebível uma nova e totalmente desconhecida espécie ocorrer na Amazônia central a 100 km da metrópole de Manaus", afirmou. De acordo com o pesquisador, a descoberta já atrai turistas observadores de aves do mundo todo, se configurando como uma possível atividade para geração de renda para a população. 

Uma outra espécie do relatório, também descrita por Mário e outros pesquisadores, é o chorozinho-esperado (Herpsilochmus praedictus). Uma curiosidade sobre a descoberta da ave é que sua existência já era prevista pelos pesquisadores, por haver diferentes espécies do gênero em várias regiões da Amazônia. "A aparente ausência de uma espécie desse gênero na região entre os rios Madeira e Purus me parecia mais provável que fosse artefato de falta de amostragem, do que uma lacuna real.  Imaginei que um dia alguém fosse achar um nessa região e que seria uma espécie nova.  Só não sabia que aquele ‘alguém’ seria eu mesmo!", brincou o pesquisador.  

O relatório

Esses resultados fazem parte do Relatório de Novas Espécies de Vertebrados e Plantas na Amazônia entre 2014 e 2015. A publicação, desenvolvida pela WWF e pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá. Ao todo, foram 381 novas espécies descritas no período na Amazônia, sendo 216 plantas, 93 peixes, 32 anfíbios, 19 répteis, 01 ave e 20 mamíferos

Conheça o relatório aqui.

Texto: Amanda Lelis

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