Modelo de prevenção de conflitos entre felinos e comunidades tradicionais é pesquisado para a Amazônia

Publicado em: 20 de junho de 2015

Foto: Raimundo Sevalho

Os conflitos entre as populações humanas e animais selvagens têm gerado prejuízos para as comunidades ribeirinhas da Amazônia, assim como para os animais. Uma pesquisa realizada pelo Instituto Mamirauá, unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), busca identificar características que possam ser referência para a criação de um modelo de previsão da distribuição espacial e temporal dos ataques de onça-pintada a animais domésticos na Amazônia Central.

Esse conflito, além de gerar insegurança e perdas econômicas, com a predação de animais domésticos criados nas comunidades, também se configura como uma possível causa para o declínio populacional de onças-pintadas na região, com o abate de onças por retaliação.

"A ideia é identificar os fatores que tornam mais provável o ataque da onça. Depois, criar um mapa de previsão para identificar os locais que têm maior risco e estudar alternativas para reduzir a probabilidade da ocorrência desses ataques", afirmou Wezddy Del Toro, pesquisadora do Grupo de Pesquisa Ecologia e Conservação de Felinos na Amazônia do Instituto Mamirauá.

Por meio de entrevistas com os comunitários, são investigados o tamanho da comunidade, o número de casas, o tipo de ambiente em que está inserida (por exemplo, se a comunidade está localizada em ambiente de várzea ou terra firme), quais animais são criados, qual o tipo de manejo praticado pelo produtor, se já houve ocorrência de conflitos, quantos e quais animais da criação já foram predados por onças, entre outras informações.

"Esse tipo de modelo, testado para prever catástrofes em outras partes do mundo, tem sido eficaz. É uma ferramenta poderosa para tratar essas situações de predação. Existem modelos similares para lobos nos Estados Unidos, para ursos na Europa, para tigres na Índia. Estamos criando um modelo adequado à realidade da Amazônia", reforçou Wezddy.

A proposta é criar um modelo que possa ser expandido para outras áreas da Amazônia, que possuam perfil similar ao das áreas estudadas. De acordo com a pesquisadora, a ideia é que o modelo já tenha sido criado e testado até junho de 2016.   

"A ideia é ter uma ferramenta que possa ajudar a saber onde é mais provável das predações a animais de criação acontecerem. Tendo esse modelo, a gente pode identificar quais as áreas estão precisando mais atenção e a gente pode focar os esforços, tanto para o manejo, quanto para a pesquisa. Com ele, podemos identificar áreas críticas para ter maior efetividade", destacou a pesquisadora.

O estudo é realizado desde 2013 e abrange cinco Unidades de Conservação: as Reservas de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá e Amanã, as Reservas Extrativistas do Rio Jutaí e Auati-Paraná e a Floresta Nacional de Tefé. As diferentes características desses ambientes possibilitam a comparação entre os dados coletados das distintas áreas, a fim de avaliar se há variação na quantidade de ataques em função do ambiente e características dessas Unidades.

 De acordo com a pesquisadora, "o objetivo do modelo é reduzir o número de animais de criação mortos por causa dos ataques da onça, ou seja, diminuir as perdas econômicas dos comunitários, aumentar a segurança deles, e reduzir o número de onças mortas por retaliação". O foco principal do projeto é o conflito com a onça-pintada, mas o estudo também investiga os conflitos em razão do ataque da onça-vermelha e do gato-maracajá.

Outro fator avaliado na pesquisa é a percepção dos comunitários em relação a esses animais. "É fundamental que sejam realizados estudos para conhecer a percepção dos moradores das comunidades e incentivar um planejamento participativo, buscando testar alternativas de manejo dos animais de criação que possam reduzir tanto os eventos de predação dos animais domésticos por felinos quanto a consequente morte dos felinos por retaliação", afirma Wezddy.

Resultados prévios:  Resex do Rio Jutaí

Com extensão de cerca de 275 mil hectares, a Resex do Rio Jutaí possui mais de dez anos de criação. Localizada próxima às fronteiras do país com a Colômbia e com o Peru, a região concilia dois tipos de ambiente: terra firme e várzea. Em junho de 2014, a equipe do Instituto visitou 22 comunidades, com cerca de 1.200 habitantes.

Esse é o primeiro estudo sobre conflitos entre humanos e felinos na região da Resex do Rio Jutaí. Os dados coletados já foram avaliados e os resultados serão apresentados no próximo Simpósio sobre Conservação e Manejo Participativo na Amazônia, que será realizado entre 01 e 03 de julho, na sede do Instituto em Tefé (AM).

A coleta de dados demonstrou que nas 22 comunidades 1.875 animais domésticos eram criados na época. Os comunitários relataram a predação de 292 animais por felinos entre janeiro de 2013 e junho de 2014, sendo que 77% dos animais foram predados por onça-pintada e onça-preta. Também foi observado que 63% dos animais predados eram galinhas, animais criados em maior proporção pelos comunitários, e o segundo animal mais predado foi o pato (29%). As entrevistas também demonstraram que a maior parte dos animais predados (90%) eram criados na terra firme e apenas 10% eram criados na várzea. O estudo demonstrou também que a maioria dos animais foram predados no período da enchente (75%), durante a noite (79%). 

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