Agricultura familiar, juventude e liderança: o exemplo do jovem formado pelo CVT no Instituto Mamirauá

Publicado em:  2 de março de 2016

Carlos de Carvalho Gonçalves, de 25 anos, concluiu esse ano o curso no Centro Vocacional Tecnológico (CVT) – Tecnologias Sociais da Amazônia. Com o certificado em mãos, o jovem comemora os resultados do seu trabalho de conclusão de curso, um projeto para o fortalecimento da agricultura familiar, com sugestões para adequação da atividade aos ciclos sazonais na região.

Morador da comunidade Costa da Ilha, localizada no município de Fonte Boa (Am), em 2015, Carlos esteve em Brasí­lia, para representar os agricultores da região do Médio Solimões, como delegado na Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Em entrevista à equipe do Instituto Mamirauá, unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, Carlos falou sobre essa experiência e, também, sobre seus planos e expectativas para a comunidade após a conclusão do curso.

IM: Como você acha que a sua formação no CVT pode te ajudar como uma liderança na comunidade?

Carlos: Com a minha chegada de retorno à comunidade, a gente vê que eles acreditam na gente. Por eu ter novas ferramentas que eu vim buscar aqui no CVT. Eu não tinha noção de como precisava ser o trabalho numa associação comunitária, como explicar esse trabalho e poder levar adiante. Hoje faço parte da organização da gestão da comunidade e isso me ajudou muito a ter mais compromisso e responsabilidade com o meu trabalho. E também a ajudar as pessoas da forma como elas me ajudaram, acreditaram em mim pra eu poder levar o trabalho adiante. Me ajudou muito pra eu poder falar pra eles que o papel que eu estava fazendo no CVT foi pra levar mais informações e levar o trabalho que está dentro da associação e ter responsabilidade na hora de defender a associação. Hoje, eu sou secretário da associação, um trabalho que eu sempre queria, poder explicar para as pessoas o valor do dinheiro que eles dão, a importância desse dinheiro pra poder beneficiar a eles, a associação e a comunidade. Quando cobrarem da gente, a associação estar bem legalizada, ter os documentos em ordem pra não prejudicar nenhuma das famílias.

IM: Como foi a execução do seu projeto de conclusão de curso, junto à comunidade?

Carlos: O projeto já foi 100% executado, estamos no segundo passo, que é replantar as espécies. São 16 agricultores trabalhando em dois canteiros suspensos. A partir de março ou abril vamos ter a primeira colheita. Com o projeto, conseguimos levantar um valor e um trabalho que ninguém acreditava. Foi uma vitória pra todos nós, muito positivo. A produção foi vendida pro município de Fonte Boa, que fica a 45 minutos da comunidade.

No começo do trabalho, muita gente não acreditou que ele ia dar um retorno financeiro para as famílias, porque eles não estão acostumados a fazer os canteiros suspensos em época de seca, só na cheia. Agora vamos poder juntar parcerias e ajudar mais ainda os agricultores, como já tem pessoas que querem entrar no grupo, que não acreditavam na iniciativa e hoje defendem, colocam valor. E isso pra mim foi uma conquista maior. Essa visão. Então, o projeto foi o papel fundamental que houve na comunidade, pessoas que não tinham essa visão, hoje têm e defendem essa iniciativa.

IM: E como foi o evento em Brasí­lia?

Carlos: Foi sobre o valor da alimentação nas escolas. Hoje, como nós somos delegados de municípios que trabalham com agricultura familiar, o foco maior é fazer parte da escola da comunidade e poder incentivar os alunos, os professores, os familiares e todas as pessoas a dar importância à alimentação que existe na comunidade. Tem vários períodos da produção na comunidade, tem época do açaí, tem época da melancia, tem época de várias produções. Então, o maior foco é tirar esses enlatados da escola e colocar alimentação de verdade.

IM: Tinham pessoas de outras regiões do pais? Houve uma troca de conhecimentos?

Carlos: Pra mim foi um trabalho único que vou levar pro resto da minha vida, poder trocar experiência com várias pessoas que trabalham na área que eu estou trabalhando.  Eles me deram ideias pra poder levar o trabalho adiante,  de como trabalhar numa gestão, como incentivar as pessoas pra trabalhar mais com essa iniciativa.

IM: E como se sente hoje, depois da conclusão do curso no CVT?

Carlos: É mais um sonho realizado. Cinco anos atrás eu tinha um pensamento muito diferente do Instituto e hoje agradeço essa oportunidade de poder estudar e poder esclarecer para as pessoas a importância do Instituto para a nossa Reserva e nossa região. No CVT, eu aprendi mais do que esperava, aprendi que o valor de uma pessoa não vem de qualidade, vem de acreditar em si mesmo. No começo, quando eu vim pro CVT, eu tinha muito medo de falhar comigo mesmo. Hoje não, eu saio dizendo que eu sou capaz do que eu posso fazer. Tive medo de fazer uma ata, de escrever um relatório, isso nunca passava na minha cabeça que eu ia fazer. E hoje eu vejo que eu sou capaz. Eu aprendi como é trabalhar numa organização, como buscar parcerias, ser criticado e esperar a pessoa falar para se defender. Nessa vida não é só ganhar, mas também perder, pra ter experiência e não errar no futuro. Hoje eu vejo que o meu aprendizado e que a minha formação facilitou várias coisas, as portas estão abertas pra gente como não estavam dois anos atrás.

IM: E você pretende continuar contribuindo para a comunidade e para a Associação?

Carlos: Esse ano estou querendo continuar trabalhando lá. Pretendo fazer vestibular, estudar por um período e voltar. Já fui convidado para dar aula, mas eu tenho um débito com a associação, por ter me ajudado nesses dois anos. Então, eu preciso dar um retorno pra comunidade, não só com esse projeto, mas já estamos pensando em outro, que é colocar bombeamento de água. Estamos com o pensamento de organizar a comunidade e buscar parcerias pra realizar mais esse projeto. Então, estamos quase dois passos à frente, mas não é o suficiente, vamos lutar mais ainda. Hoje a comunidade acredita que o trabalho pode ser simples como for, mas dá valor a todos nós. 

Por Amanda Lelis

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